Muda muito mais do que simplesmente a matéria-prima da comunicação. A imagem traz consigo uma aparente capacidade de convicção, de que a palavra não pode dispor. A palavra escrita permite e convida ao questionamento, ao retorno aos argumentos, à escrita, à réplica. O texto escrito permite um nível de profundidade nas abordagens, com menor poder de convencimento imediato - por mais impactante que seja o estilo de um autor -, muito diferente do efeito que as imagens podem produzir.
Mesmo a imprensa escrita perde em comparação com a projeção das imagens - no cinema, na televisão ou na fotografia. O imaginário contemporâneo - e isto se deu ao longo de praticamente todo o século 20 - ficou marcado por imagens, mais do que por palavras escritas.
Se tomamos a capacidade estadunidense - incomparavelmente maior do que a que a européia - para influenciar as pessoas, podemos constatar que os EUA já praticamente não produzem aparelhos de televisão, mas o que conta realmente é que eles produzem 75% das imagens que são vistas no mundo. E as imagens são tudo, menos neutras. Elas passam idéias sobre o que é belo, bom, válido, legítimo, até mesmo o que é eficiente, o que vale a pena.
Uma das tragédias do mundo neste começo do século 21 é a intensificação da crise da leitura. A imprensa escrita e as editoras são vítimas privilegiadas desse processo. Praticamente todos os jornais e revistas do mundo vêem diminuir seus leitores, assim como em todos os paises as vendas de livros diminuem. Na França, como exemplo de país com grande tradição de leitura, todos os jornais têm diminuído suas tiragens. Sofrem os efeitos da internet - os matutinos deixam jornais gratuitos para os estudantes nas entradas das faculdades, mas os estudantes não os pegam, passam direto para lê-los no computador. Por outro lado, os jornais gratuitos nos metrôs também os afetam. A partir de uma pesquisa que diz que os franceses teriam 20 minutos diários para leitura, o grande sucesso é um jornal gratuito distribuído nos metrôs chamado exatamente Vinte Minutos, que pode ser lido no trajeto e jogado fora na saída.
Pierre Bourdieu só aceitava dar entrevistas nas tevês públicas, para garantir que pudesse ter o tempo suficiente para argu- mentar, contra-argumentar, retornar sobre seus argumentos. Dizia que “a velocidade é inimiga da verdade”. A velocidade, hoje, é sobretudo a velociSdade das imagens. Em uma sociedade como a brasileira, em que 75% são analfabetos funcionais - isto é, não conseguem ler uma carta, entender e responder, precisam do personagem da Fernanda Montenegro em Central do Brasil -, a capacidade de influencia das imagens é então incomparável.
Novas gerações já acessam muito mais a internet do que usam tempo dos seus dias para ler jornais, revistas ou livros. Têm à sua disposição uma massa de informações incomparavelmente maior do que dispunham as gerações precedentes. Mas produz-se paralelamente o que se passou a chamar de “novo analfabetismo”: uma massa de conhecimentos, acompanhada da incapacidade de interpretação. O simples acúmulo de dados sobre a realidade não significa capacidade de compreensão do mundo. Este supõe capacidade teórica, que só pode ser obtida com palavras escritas e com tempo. Inclusive para compreender as imagens - que não falam por si sós, sem o instrumento da palavra escrita.
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